segunda-feira, 31 de março de 2025


um bom livro
é como um rio
não se banha nele duas vezes repetidas
é sempre nova a leitura e novo o leitor

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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025


Do nosso Brasil, no alquebrado coração
Tanto suspense assim não há de caber, não!
É muito suspense segurando a emoção
De ver Bolsonado em uma cela de prisão.

Depois pra des-lembrar a histórica vergonha
De o ter elegido, o país inteiro sonha
Com a promulgação de lei que lhe proponha
A lucidez dos cigarrinhos de maconha.

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segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

A costureira

És a metamorfose das metamorfoses
E os dois lados da mística fronteira coses.
Dama triste e absoluta do fatal corte,
Que tecido tramas tu, oh! Esfíngica Morte?

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domingo, 3 de novembro de 2024

VIDA

acontecimento mágico
que começa com um milagre
e termina com um escândalo

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tanta é a eternidade
do instante
que o instante
da eternidade
insta
a idade eterna
do instante

-

sábado, 2 de novembro de 2024

CAETANEANDO (Ema Viana)

o certo é dizer que o certo é
do avesso do avesso do avesso
de certo avesso errado certo
ou não

Pleito

Tem fome de carniça o urubu
E todo seu devoto brucutu.
O tal youtuber não será eleito
De nossa Fortaleza o prefeito.
Não desesperem, amigas, pois 
O treze vencerá o vinte e dois.
Aquele que de mulher desdenha
Na cidade da Maria da Penha
Será solenemente derrotado
Tendo dele ou não o cu raspado.

-

P(h)onte

feito ave
linda e suave
quando paira
vejo-te, Maira
em voo breve
és graça, és leve.

os tantos anos de agora
são-te ainda leves.
como outrora,
naquela ave
que não breve
me habitou
ainda graças, suave.

-

Ex-passo

foi e não voltou
quando tava lá
lá era onde aqui lá tava
tempo de estar
entre mentes
estado fusional de lugares
em fazimento

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domingo, 17 de março de 2024

ACADEMIA DA PERFEIÇÃO

A graça com que se move
A deusa da academia
Deslumbra a todos, comove
Mais do que tudo, inebria.

Do que ela bem mais formosa
Apareceu a desfilar
Outra moça, toda prosa,
A sucedendo no altar.

Como rodar é da roda
Certo outra delas virá
Num moda sucede moda
Ocupar-lhes o lugar.

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quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

DA LUA AO CHÃO

olhos postos na lua
passeava sonhos fabulosos
viagens intergalácticas
suaves voos de pássaro
braços de bem-amada
a inteiro envolver-me
num acalanto sem par.

súbito, os olhos me vão
da lua ao chão.
o pé direito
tenho-o imerso
em ignorada substância
de amarelo aspecto.

pisei (n)o cocô!
pisei (n)o cocô
e não sei que fazer
água por perto não vejo
não vejo pano ou sabão
com que me possa limpar.

pisei (n)o cocô
enquanto sonhava
pisei (n)o cocô
e estava descalço
pisei (n)o cocô
e não sei que fazer.

amiga, me diga:
amputo este pé
ou pisando (n)a merda
aprendo a viver?

P.S.: os parênteses vão para os puritanos patrulheiros do idioma; o poema, para os coiotes (nome do grupo literário dos tempos da faculdade).
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Odisseia da instante (Ema Viana)

boca desdentada
lírica flor do caos
preenche o ruído com teu silêncio
profundo
mastiga sonhos matinais
ri
leve
perene
transversal
dúctil 
concede
recebe
beligera
depois gargalha abissal
deglute
digere
e excreta tua doce elegia
buraco negro ancestral
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sexta-feira, 17 de novembro de 2023


na cabaça
da cabeça
cabem
cabrestos
à beça
descabaceiem-se

GUIA

brinca 
a espontânea luz da infância nos teus olhos
saltita, rola, dá cambalhotas
cai, levanta, estranha, zanga
e volta sempre a brincar
a espontânea luz da infância nos teus olhos
espraia-se infinito
iluminando campos de alegria
onde por veredas da nostalgia
voltamos com a tua luz guia
à criança que fomos um dia

-

DES-TINO

vez no longe sudeste
o homem antes nordeste
em desaprumo em desatino
vai viver sudestino
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domingo, 17 de setembro de 2023

COMPREENSÃO

a vida é um acontecimento mágico
compreendido
entre um milagre e um escândalo
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sexta-feira, 14 de julho de 2023

OFICINA

zé excelso
zé excede
zé não cessa
zé excele

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terça-feira, 27 de junho de 2023

A PODA DO LIMOEIRO

Ouça aqui bem, meu amigo,
O que lhe tenho a contar.
O meu limoeiro antigo
Cedo cuidei de podar.

A tesoura então eu peguei
Para os seus galhos cortar
E estranha coisa topei.
Passo agora a relatar.

Veja, meu amigo, você
Pode até não acreditar.
Era tamanho GG
Do design nem vou falar.

Cerzida em tecido rosa
Com o verde a contrastar
Coisa mesmo curiosa
Para num limoeiro estar.

Ei-la diante de mim
Se me dando ao olhar.
Tomou-me a dúvida assim:
"Devo pegar, não pegar?"

Nas mãos agora eu tinha
Algo para matutar.
Como é que uma calcinha
Vai num limoeiro parar?

Pertenceria à vizinha
Dona do segundo andar
Ou à francesa que vinha
Em Fortaleza estudar?

De qual delas duas não sei
Com certeza precisar.
Sei que oferecida a achei
No limoeiro a se dar.

Assumo entanto que mais
E vou a você confessar
A mim muito mais me apraz
Calcinha a cueca encontrar.

Fértil minha cabecinha
Deu então de cogitar
Com muitos pés de calcinha
Um generoso pomar.

Resumo enfim o roteiro:
Absorto a imaginar
Fiquei o meu limoeiro
Esquecido de podar.

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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023


Sua inocência brincante
Aqui e agora
A criança chora

Do adulto o infante
Vem e vai embora
Sem estar dentro nem fora

O ser porém do que ante
A anamorfose d'outrora
Fora está e se demora
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quarta-feira, 5 de outubro de 2022


Livre a alma de arma
Ame a alma de livro
Arme de livro a alma
Livro a arma de livre

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terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Íntimo poema inquiridor


Mor, responde, mor,
Como se cavou o abismo 
Anos-luz separador 
Entre a falta que ama
E o presente desta dor?
É a ausência que clama, mor,
Por antídoto reparador.
Está na alma de todo amador,
Está no simples ar, mor.

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terça-feira, 7 de dezembro de 2021

AMOR

amor 
clausura
à espera de combustão
queimá-lo 
toda a anti-receita
de qualquer procrastinação

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quarta-feira, 22 de setembro de 2021

MÃE

Eis-nos aqui, a sua descendência, diante da "falta que ama" a adensar-se pouco a pouco numa espécie de conta-gotas invertido a preencher-nos de mais falta a cada nova lágrima vertida. Eis-nos, a sua descendência, diante da falta do para onde ir, da falta colo matricial, da falta regaço absoluto, sempre à disposição e eternamente acolhedor. Eis-nos aqui diante da falta mãe. 

Para mim, não há mais o distrair-se do desamparo a não ser na companhia de Jesus e Deus com Nossa Senhora passando à frente, como minha mãezinha recomendava nas despedidas. Partiu a mãe de um menino em cujas orações pueris estava, mais do que o pedido, a súplica para partir antes. Um caso edipiano clássico, eu sei. Mas minha Jocasta morreu e eu não me tornei cego. Então, porque ainda vejo, e agora mais complexamente do que via quando menino, sigo, muito menos sabido e um tiquinho mais sábio, com Jesus, Deus e Nossa Senhora à frente, sob os cuidados de minha mãezinha. E em sua honra e em seu louvor, hei de viver.

Falo não só em meu nome, Dona Ivone, mas no de suas filhas, de seus netos e netas, de seu bisneto. No final, amada e nobre matriarca, tudo há de ser mesmo muito bom para quem concedeu-nos a dádiva da vida. Os seus seguiremos com o exemplo de amor, dedicação e força que a senhora sempre foi. Ficaremos para preservar sua memória no “mais que humano em nós”. Obrigados, nobre senhora, muitos obrigados.

 

Segue o poema de dia das mães inspirado sobretudo na senhora, mãe.


alegria
neste dia
pra quem fia
e desfia
pela cria
alegria
pra maria
pra mairinha
pra meirinha
pra rosinha
pra carlinha
alegria
neste dia
mães Maria

-

segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Sabedoria de surfista

se mar revolto
ou em remanso
prazer na areia
brô

-

Sabedoria de estilista

a vida é uma mina-saia
curta

-

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Com/contra Mário Quintana

quando um pedaço de laço 
deixa outro pedaço de laço
no abraço
não como no laço
pedaço e pedaço permanecem
pedaço e pedaço saem mais que pedaços do laço
saem pedaços abraçados
pedaços do laço do abraço
pedaços abraçolaçados

-

domingo, 4 de abril de 2021

Imaginação

uma gaivota cruza
o espaço no ar do seu tempo
imagino o que vai dentro
como imaginação
-

sábado, 27 de março de 2021

 

O velhinho na velhinha roça...

Dobra-se-lhe flexível a rola

Para que o velhinho afinal possa

Na velhinha excitada pô-la

-

segunda-feira, 8 de março de 2021

Poema carnavalesco

carne é nau
nau deriva
em alto mar

carne é sal
sal saliva
pro paladar

carne é flor
florilégio 
de navegar

carne é vau
vau mistério
de naufragar

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quarta-feira, 29 de julho de 2020

SENZA RISCOPRIRE ALCUNA SPERANZA

Em pústula entumescida
Guardam-se da agulha do tempo
Os poemas adiados
Rompe-se-lhe o fino epidérmico
E excretam-se-lhe os versos intempéries

-

segunda-feira, 29 de junho de 2020


Há algum tempo, calava-me diante de argumentos a favor de aulas semi-presenciais, um meio que ensino à distância, ou quase. Diziam-me que, com o avanço da tecnologia, muito do que se fazia em sala presencialmente poderia ser substituído, com vantagem, por atividades on-line. Era o futuro. Vi-me na iminência de dar razão aos que denunciavam a obsolescência do estilo de aula tradicional. A pandemia chegou e nos isolou. No entanto, deu-me a entender que ter silenciado perante aqueles argumentos não foi boa opção pois nada é comparável a uma aula com corpo e alma presentes. Quando t(r)ocada com amor, aula é uma espécie de ritual sagrado, de dádiva adventícia na sua irrepetibilidade. Os vocacionados se preparam para ela desde dentro e para sempre. Curtem a espera, o encontro, o ler-se mutuamente a presença em muitos níveis. Gostam de partilhar o mesmo espaço físico, de vê-lo preenchido com a vida múltipla e variada em ação. Aula é um encontro sem igual que prepara conservando a nossa humanidade. Sou hoje defensor ferrenho desse encontro sagrado em que se celebram o saber sentir e o sentir saber.
-

quinta-feira, 21 de maio de 2020


a palavra é palavra de palavra
dela espera e desespera
por letramentos
da coisa transbordada
do deus encarcerado
o homem encurralado

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segunda-feira, 18 de novembro de 2019

SUMA TRADUÇÃO

mistério
intraduz
pouco demais
e o pouco do mais
que extraduz
em arte-fato
torna-nos além
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quarta-feira, 23 de outubro de 2019


Vi prodígios de inteligência e intuição numa existência tumultuada pela Verdade. No caminho aberto pelo gigante, a cada papo e afago de alma, o topo oco de minha cabeça ganhava qualquer ou nenhuma direção. Exímio em tudo! Para quem o conheceu de perto, é mestre eterno a ensinar a líquida consistência do ser. Guardo-o em mim. Um zilhão de vezes: obrigado, Paulo Mosânio.
Com você, a alta cultura, pascalianamente despida do vaidoso manto nobiliárquico, dava voos rasos nas nossas cabeças, longe, muito longe do pomposo aparato da erudição balofa e sem propósito. Era em roupa comum e cotidiana, franciscanamente simples, que a nobreza generosa do seu espírito doava, com zelo e amor, o saber cultivado nos vãos luminosos da sua mente-coração. Com você, era o saber peripatético, o credo quia absurdum, a régua nominalista, o deus sive natura, o budismo moderno, os versos íntimos da mão que afaga e apedreja, os ademanes de ternura, a flor do lodo, o sagrado, o profano, o estado de perene poesia. E o gesto ostensivo do braço todo arrepiado.
Era assim, é assim, será assim, da cátedra à mesa de bar, ob-ligado a você, Paulo Mosânio.
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sábado, 12 de janeiro de 2019

Flor de melancolia

tão festiva a rua passa
pelos olhos da menina melancólica
que flores de melancolia
desabotoam
nos olhos 
de rua 
da menina

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segunda-feira, 29 de outubro de 2018

ANTILÓGICA DA MAIS-VALIA II

bordado de poesia
na barra dura do dia
a dia mais eu queria
bordado de poesia

bordado de poesia
ante toda vilania
momento epifania
bordado de poesia

bordado de poesia
num coração valentia
contra qualquer tirania
bordado de poesia

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sábado, 9 de junho de 2018

SÚMULA DE UM HOMEM DE NEGÓCIO

Vendia pirulito-guarda-chuva naquela tabuinha com pequenos furos suspensa por um barbante volteando o pescoço. Uns dez anos por aí. Dos seus primeiros trabalhos. Depois picolé, maçã do amor e quebra-queixo. Um dia passou por casa de porta aberta, longo corredor e trânsito de gente prometendo boas vendas. Dentro, velava-se defunto.

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quarta-feira, 6 de junho de 2018


Qual seria a palavra mais esculhambada da língua portuguesa? 
Para produzi-la, a língua e a boca fazem tantos torneios que chegam à iminência de esculhambarem-se. São múltiplos pontos e modos de articulação: vogais alta e baixa, anterior e posterior, oral e nasal, arredondada e não-arredondada, consoantes oclusiva, fricativa, lateral e, para sua maior esculhambação, a palavra ainda conta com um ditongo nasal dificilmente encontrável em outro idioma. "Esculhambação" legítima mesmo só existe em língua portuguesa.
-

sexta-feira, 18 de maio de 2018


instantes de poesia
na barra dura do dia
a dia mais eu queria
instantes de poesia

terça-feira, 15 de maio de 2018


alegria cultura
tua vontade dura
saúde bastante
meu desejo instante

levarás, amigo
todo amor contigo
tal breve certa ave
hás de voar suave

sempre tateante
a traçar doravante
d’ tua vida futura
o plano arquitetura

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quinta-feira, 10 de maio de 2018

PARA DOXA

Noite gelada. Família saindo de restaurante com meia garrafa de vinho nas mãos. À frente, cena trágico-lírica. Morador de rua abraçado a um cão numa esquina. Frio fino de cortar a medula. Lógica implicativa: vinho aquece.
- Meu senhor, aceitaria?
- Não, muito obrigado! Eu não bebo.

-

domingo, 8 de abril de 2018

É

Vi prodígios de inteligência e intuição numa existência tumultuada pela Verdade. No caminho aberto pelo gigante, a cada papo e afago de alma, o topo oco de minha cabeça ganhava qualquer ou nenhuma direção. Exímio em tudo, para quem o conheceu de perto, é mestre eterno a ensinar a líquida consistência do ser. Guardo-o em mim. Um zilhão de vezes: obrigado, Paulo Mosânio!
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sexta-feira, 23 de março de 2018

De(u)sproporção

Dog : doG :: God : goD

          GoDoG
-

sábado, 3 de fevereiro de 2018

DENTRO DA ORDEM

a ordem
é manter a ordem
sob a ordem
dos que dão ordem
a qualquer ordem
-

quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

BEM FEITO !

se ser humano é
inferno e maravilha
que o bem seja
bem feito!
-

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

FAMÍLIA

Estranha essa coisa de família. Afeto que se estende generoso e sem medida cabendo nele o mesmo e outros sangues. É um querer ser perto nas distâncias do dia a dia. É certeza última, dúvida, alegria. Lugar onde se começa e se termina criança. Sítio onde pode a máscara descansar. Família é colchão macio para o corpo exausto de viver. Família é "celula mater", é matéria de bem-querer.

-

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

RIMA POBRE

nada
no poema
da palavra habilitada
a rimar

seja o que flor
amor ou dor
lançar fora do poema
por favor

rimar em al
por exemplo
é mal banal

original
é fazer o al
do canivete
mais que o do punhal
soar igual
substantival
a outro al
que ecoa
na pessoa boa
magoa
e é fatal
-


salve salve
o brasil capoeira
que negaceia 
entre
eficiência e beleza.
-

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

SILÊNCIO

tantas são as confissões a fazer
tantos por dizer assediam
que muito aborrece a profusão
do inchado de palavras e sentidos
cultua o profanado
silencia
-

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

SONHO DANTESCO

num trenó tracionado por renas voadoras
uma mula sem cabeça
veio enjaular 
o saci-pererê e o curupira
hércules-quasímodos
de um brasil multilado
-

TEMPO

tempo para o trabalho
trabalho para o dinheiro
dinheiro para o trabalho
trabalho para o tempo
-

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017


oferecer a outra face
antes de tornar o ofendido melhor que o ofensor
prova é que
não se cumpriu a ofensa
-
cidades são corpos
tatuados ou não
de cuja ansiedade
sótão e porão
-

SOBRE NOMES

Aggio, Rigo, Turpin, Cury, Tomiazo, Guirar, Schmidt, Boechat, Boa Ventura, Ibarra e um Souza, eis os sobrenomes de uma página brasileira do face em cujo diálogo entrei por acaso. No texto principal, motivador das postagens, tecia-se um discurso-leitura da situação política brasileira e, segundo os frequentadores do autor e, provavelmente, o próprio autor, o texto pretendia-se irônico. Não captei a ironia, evidente talvez para os frequentadores da página. Depois de ter sido alvo de uma ironia, escrevi "captei as ironias". Fui amado pela resposta. Estava no jogo. Mas incomodado com a situação, postei: "Um comentário sobre a ironia. É uma figura de pensamento que mais depende do modo como o texto foi elaborado e do momento de sua recepção do que das intenções do autor. Trata-se de um efeito de sentido alcançado toda vez que o conteúdo captado no enunciado entra em relação com outro conteúdo, que lhe é contrário ou contraditório, atribuído à enunciação (ato de dizer). Para que esse efeito de sentido seja captado, é preciso então que os dois conteúdos estejam explicitados no enunciado: um como enunciado propriamente dito e outro como enunciação enunciada. Por exemplo, há ironia no dizer "captei as ironias" quando o texto no qual se diz ter captado as ironias não logrou dar forma à ironia." Não sei se os da página captaram a ironia, mas podemos ver que os sobrenomes ainda dividem o Brasil. Às vezes, as coisas se misturam um pouquinho e pinta  um Szasz entre os da senzala ou um Silva entre os da casa-grande.
-

SER E ESTAR

ser é estar no templo
do tempo
estar é ser no paço
do epaço
-

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

CAE CAE, CAEIRINHO

na cara
dos caeretas
cae cae
caetano
como leite bom
_

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

ALIVE IN A LINE

                        para Aline

em estado puro
celebração da substância
o absoluto
supremo da criação
em estado bruto

do denso e do volátil
em ti
sabem à vida
todos os sentidos

orbitante da tua feliz gravidade
louva
a carne que te gerou
e está a te gerar
a cada novo dia

-

domingo, 14 de maio de 2017

DIA DE MARIAS (Ema Viana)

alegria
neste dia
pra quem fia
e desfia
pela cria
alegria
pra maria
pra mairinha
pra meirinha
pra rosinha
pra carlinha
alegria
neste dia
mães Maria

-

quarta-feira, 3 de maio de 2017

NOSSO PAI QUE ESTÁ NO SEU (Ema Viana)

Há algum tempo o tempo concedeu-me a graça de perceber o descompasso abissal que o tempo erige entre o que o espírito quer e o que pode o corpo. Estava estampado nas feições do meu pai, que sempre fora uma força da natureza numa infância sem fim. Naquele tempo, o tempo parou para pensar e, do tempo pensado, extraiu-se a tempo o dom do sem tempo do poema para meu pai, que não lhe chegou às mãos a tempo. Creio, no entanto, que tempo há para doá-lo aqui para ouvidos de matéria humana.

Guarda tua espada, destemido guerreiro.
Deixaram de ser as abstratas figuras
E não há mais dulcineias por quem lutar.
Recolhe-te, consternado, ao teu castelo
Provisório, reconhecendo-te velho.
Tens a pujança dos vinte
E teu corpo vencido denuncia a verdade.
Não fossem os espelhos,
Poderias imaginar-te a meio caminho,
Entre pujança e pungência.

No tempo de agora, desde o tempo de então, o tempo não parou, adensou-se mais e mais na infância sem fim do meu pai e o fez mergulhar no tempo profundo da hora absoluta.

Sensação esquisita a de não ter mais tempo para dizer a quem ouça com ouvidos de matéria humana “meu pai”.

-

quinta-feira, 9 de março de 2017

SABEDORIA DE SURFISTA

se mar revolto
ou em remanso
prazer na areia
brô.

-

sábado, 26 de novembro de 2016

POESIA DO COTIDIANO

Seu Zé Cláudio, 93 anos,
sem muita instrução formal,
confrontado com um
"tudo bem, seu Zé Cláudio?",
põe a pergunta noutra chave
respondendo macio e afiado:

Tudo é bom!

-

sábado, 6 de agosto de 2016

A GRANDE JOGADA (Ema Viana)

jogador joga jogo
jogo jogado joga
jogado jogador
jogador de jogado
jogo jogador joga
e jogo joga jogo
jogando jogador


-

sábado, 30 de janeiro de 2016

A LUCINAÇÃO (Ema Viana)

A nação é testemunha
Vitálício da mumunha
Larápio-mor, sua alcunha
Já não engana o tal Cunha

Pra esquecer essa vergonha
O Brasil inteiro sonha
Com a lei que lhe proponha
Cigarrinhos de maconha

-

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

ANTILÓGICA DA MAIS-VALIA I (Ema Viana)

se
no produssumo
o humano sumo
é numo e numo
então
a poesia
a cada dia 
é mais valia

-

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

DINÂMICA DA CONCENTRAÇÃO (Ema Viana)

uns sempre                  
outros não deixam de  
outros ainda
                     às vezes sim
                     às vezes não          
para que
os que nunca            
continuem a                        
e os que sempre  
não deixem de          

-

sábado, 26 de setembro de 2015

LEITURA (Ema Viana)

Sugestão para alguns estudantes das Ciências Humanas

                  para 
de ler sem parar
                  para
                  parar
                  para ler


sábado, 29 de agosto de 2015

ANVERSO (Ema Viana)

averso a verso avesso ao verso do anverso do averso verso



terça-feira, 7 de abril de 2015

PASSAGEM 2 (Ema Viana)


do direto direito ao verso averso

-

PASSAGEM 1 (Ema Viana)


do direto direito ao verso avesso

_

quinta-feira, 1 de maio de 2014

MUSICORDANÇA (Ema Viana)

é música o corpo que dança
musidança o corpo mudança
e o corpo que música e dança
em musicordança se trança


sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

ODISSEIA DO INSTANTE (Ema Viana)

Como reteso dardo que se brande
Ante horda de inimigo espicaçada,
Com a cabeça encimando haste grande,
Vibra pela ferida desejada.

Contra a fenda de lábios excitada,
Logo investe com a sua rubra glande
E, numa cega e primeira estocada,
Mais o seu volume flâmeo se expande.

Depois, em mão nervosa beligera
Procurando oponente imaginário,
Hirta-se, faz-se gládio, vira fera

E cumpre obediente o seu calvário
Até o espasmo-fim em que se adultera
No lacteo que lhe sela o obituário.

-

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

CONVERSA FIADA (Ema Viana)

Aí o discípulo perguntou:
- Mestre, o que é o "eu"?
- O "eu" é antes de tudo um "ele" que "você" ilude e pensa muito conhecer.

-

sábado, 6 de julho de 2013

IRACEMA (Ema Viana)

Mira a cena
Iracema da América
Resolve voltar
É piracema

Ipanema
Cinema
E televisão
Iracema
Não quer mais não
Ela vai voltar
É piracema

Iracema
Irá, irá
De volta
De volta pra lá
Pra sina daquele lugar
É piracema

Iracema
Será, será
Silêncio lírico
No Ceará
'Stata à beira-mar

A mirar
A mirar

É piracema

É piracema-ma-ma
É piracema-ma-ma-ma-ma...

-

quarta-feira, 22 de maio de 2013

EDUCAÇÃO (Ema Viana)

nas humanidades
mais do que formar
a educação deve
de-
formar
a p'soa.

-

domingo, 5 de maio de 2013

LIÇÃO DE LINGUÍSTICA (Ema Viana)

É certo que a língua
É coletiva e abstrata
Mas a língua viva
No concreto dela mesma
É a que passa pelo corpo
É a do cuspe privado do indivíduo.

-

domingo, 7 de abril de 2013

ADEUS AO EU (Ema Viana)

                                                                                                                                             Para José Ney

Antes e sempre
Proferir-te como farsa
Eis a tua arte
 

Ser outro em cada canto
Diverso e mesmo para cada um
Fragmento e estilhaço


Depois e sempre

Ser do todo uma parte
Ou parte entre todos
Um todo
talvez à parte
Ou
quiçá 
Parte sem do todo ser
Ou desejar
Eis a tua busca

Ver demais, a tua dor


Que potência no outrar-te
Sendo muitos
Sendo um
Sendo sendo
Nem um
Nenhum
Nada
Nada
Tudo
Todos

Uno
Uno 
Uno
Uno

Dois de ti
Um no não
Um no sim

Noves fora

Tua saída
Mergulhar no todo-nada
Que é da vida


Um no Uno
Uno Uno
Enfim

-

terça-feira, 26 de março de 2013

ARTES (Ema Viana)

Arte do espaço, a pintura
O tempo, dizer procura
          Em vão
Do tempo a música é a arte
Que com o espaço comparte
          Em vão
Signar tempo com espaço
Num vice-verso compasso
          E não
Parecer algo impostura
Mal logra a literatura
          Ou não

-

domingo, 30 de dezembro de 2012

MULHER (Ema Bessar Viana)

Sem razão aparente, é a mercê
Da evidência do existir você
Que me leva, sei e não sei por quê,
Ao sabor de saber valer viver.

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sábado, 6 de outubro de 2012

A SEMIÓTICA ENTRE A SENSAÇÃO E A INTELECÇÃO

A semiótica, na versão tensiva de Zilberberg (a meu ver, complementar à semiótica clássica), retoma Merleau-Ponty, presente já no Semântica Estrutural de Greimas, e articula Cassirer, Deleuze e Valéry para desenvolver uma mínima iteligibilidade do sensível. Da Imperfeição e Semiótica das paixões, ambos livros do mestre lituano, vão no mesmo "sentido". Todos tentam critérios mínimos para compreender as condições de possibilidade do sentido, a partir do sensível, ou investigam o sentido do sentido, como é comum se dizer entre os semioticistas. Pensar o sentido nas suas nascentes é tentar traduzir o sensível em inteligível: tarefa sempre inacabada ou por começar. Fora desta ilusão de "cientificidade", entendida como projeto de conhecimento, há o vivido, isto é, as fricções, os atritos entre a carne-mente-espírito do homem e a carne-mente-espírito do mundo. O intelecto descontinuíza e estabiliza para organizar o inorganizável e a sensibildiade desestabiliza e continuíza  para desorganizar o organizado... Não tem fim... Estamos condenados a fazer sentido, mesmo que seja pela negação dele, e toda a liberdade possível acontece condicionada pelo sentido já feito e abre-se para o ainda por fazer.

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terça-feira, 7 de agosto de 2012

NEGUIM ADOTA NEGÃO ou O MENINO É PAI DO HOMEM

Para Pedro Arthur e Garcia
Pode a carne até não ter
E seu sangue assimilado
Dou fé entanto parecer
Raras vezes alcançado
O filho com o pai porque
Herdeiro sem ter herdado

Não nega neguim negão
Nem negão nega neguim

Com idêntica energia
Assim tão aparentado
Genoma nenhum faria
Se no pai do filho dado
O filho já não dado ia
Concebido no esperado

Não nega neguim negão
Nem negão nega neguim

Negará neguim negão?
Neguim negão nega não
Pois neguim negão será
E negão, neguim gagá



quinta-feira, 17 de maio de 2012

MACHADO ROSA CUNHA (Ema Bessar Viana)

o criança literatura rosa
e machado o velho dela prosa
o ser tão tão de dentro rosa cunha
e euclides o de fora testemunha

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sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

METAMORFOSE (Ema Bessar Viana)

a ideia lhe acorreu
quis vesti-la com palavra
pôs-se inteiro na tarefa
fez não fez
palavra por palavra
da ideia outra coisa
que a palavra não transporta

t
r
a
n
s

aborda
aporta


aborta
a
i
d
e
i
a

e daí
de uma ideia nova
aí é dia

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quarta-feira, 8 de junho de 2011

OS BAMBAS (Ema Bessar Viana)

nem
osama
a bomba
usa

nem
os ama
o bambo
obama

os bambas

usamam
abusamam
ossamam
men

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domingo, 22 de maio de 2011

ESCRITURA (Ema Bessar Viana)

Para Tércia Montenegro
crítico desabuso
o texto dela
equilíbrio
de ditos
de por dizeres
texto justa-medida

é esta
a sua escrita

não apuro formal
nem excelir de conteúdo
mas o com mestria
poética extemporânea

tem sabor a sua pena
à qual devoto bênção
humilde e celebrante

ela é
a quem
muito mais além
no quando
ela erra
ninguém

mas

ela nutre
na vertigem
da escrita
que ela erra
no dentro do dentro dela
alguém

salve, salve!

salve a palavra dela
palavra que é
no onde
ela duela
com o do eu
do ela mesma!

salve, salve!

celebro
o texto ela
anverso
do ela texto

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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O GATO (Ema Bessar Viana)

Indiferente

O gato
Melisma o silêncio
Reticencia o tempo
Agudiza o abismo
No mover-se

Indiferente

Seu olhar
Ri sinistro
Do estarmos
Entupidos de nada
E bastante comovidos

Indiferente

Seu dorso
Eriçado
Esfingia-se
Dócil e agressivo
Mas ainda

Indiferente

Seu rabo
Perscrutante
Conecta
Suprarrealidades
De borboleta e colibri

Indiferente

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terça-feira, 9 de novembro de 2010

(IN)DEFINIÇÃO (Ema Bessar Viana)

Para Garcia
Constróis pontes de luz para as ilhas
Que há muito te descobriste ser.
Plurimorficamente te encruzilhas
Em vias de dever e de querer.

Em cada novo ponto da estrada,
Apresenta-se audaciosa ante ti
Outra sempre tenaz encruzilhada,
A que tua resposta é só: "resisti(r)".

Daí serem diversos os garcias.
No mínimo um que cotidiano age
Vivendo a vida a que o outro reage.

Adivinhar qual no correr dos dias
É aquele com o qual se interage...
Ah! Isto é grande e sacana sacanage.


terça-feira, 24 de agosto de 2010

CABO VERDE BRASIL (Ema Bessar Viana)

Sólidas pontes imateriais
Ergueram-se por sobre o oceano
Ligando dois povos que, de ano em ano,
Vão se tornando menos desiguais.

Uma mesma disposição os anima:
A de abolir relações verticais,
A de que entre homem e homem nunca mais
Viceje qualquer formação que oprima.

Do elevado propósito que os guia
Reúne-os igualmente a Fortaleza:
Ter em mira realizar algum dia,

Irmanado na língua portuguesa,
O quinto império de um povo-alegria
Que viva em plenitude a morabeza.

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terça-feira, 15 de junho de 2010

PRESENÇA (Ema Bessar Viana)

É do perfume que exalas
Quando de vista te perco
Que tua presença se faz.

No esboçar-te a imagem
Âncora-perfume te ergo
Para os meus olhos de cais.

É quando toda em olores
Em vivo e vivo em cores
Tua presença fugaz.


TARDE AZUL (Ema Bessar Viana)

vem, tarde azul,
desmesura
do outrora menino
vadio e sem ninho,
não te recuses a pousar

vem, tarde azul,
o adulto te quer
de novo
viver
e em ti
re
pousar


ESTALIDO NA NOITE (Ema Bessar Viana)

A Mirko Élvis
Meu primo morreu. 
Imagino com que espanto 
Ficou traspassado pela bala do revólver 
De olho vidrado no evento.
Filho e mulher ficaram sem 
Com o tiro do revólver. 
Sabe lá em que transe, 
Com que imagens animado 
O revólver na aventura? 
Adrenalina no metal. 
Foi-se meu primo sem 
Com o tiro do revólver.

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NA TAL TERRA (Ema Viana)

Na
tal terra
da boa vontade,
é sempre encontro
de diferenças, sem medo,
sem ortodoxias, sem pretensões
de qualquer altura.
Na tal terra da esperança,
é permitido viver pela graça do simples viver,
com o viver do outro.
Na tal terra da comunhão,
homem não julga homem,
ama assim pelo só exercício de amar.
Na tal terra da harmonia,
tudo é música a concertar almas reféns da nostalgia da perfeição.
Na tal terra da bem-aventurança,
 grassa plena a fraternidade universal.
Na tal terra da consagração,
o agora instante de suave e doce congraçamento
q
u
e
r
-
s
e
eternizado.


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sábado, 10 de abril de 2010

ADOÇÃO (Ema Viana)

Para Mônica, Daniel e William

Testemunho dou de feliz encontro
Entre dois meninos e uma mulher
Que a cumprirem o que o destino quer
Convergiram rotas a um mesmo ponto.

Os três viviam o momento certo
De unirem-se em rara laqueadura.
Negaram então o espaço que enclausura
E fundiram-se por ser pouco o perto.

Não queriam um do outro só estar ao lado
Pois que cada um andava descontente
E um do outro sabiam-se dependente.

Um querer estar juntamalgamado
Fez ver que seria enfim acertado
Darem-se uns aos outros por presente.
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domingo, 28 de março de 2010

OFÍCIO (Ema Viana)

Para Crisca

parece quando falas
que vens de terras longínquas
tens uma certa linguagem
entrecruzar de línguas

falas do que falas
como quem cala
segredos
de faca
de ponta
responsável bisturi
de corte preciso
conciso

tua palavra somato-resvala
arde na epiderme
rasga carne
quebra ossos
tua palavra não cala
traspassa

de tantas línguas que dizes
por estrangeira a tua fala
tua palavra
trapaça

aprendiz das línguas que falas
mais que aprendiz
me deixo fazer nas palavras
que lavras

como falas
o que falas
agora
o falo

MERATRIZ



PERFEIÇÃO (Ema Viana)

no dentro e no fora de si mesmo
o ovo impressiona
no que tem de acabado
o ovo não tem pontas
no ser ovo ovalado
carne e osso
calcificados
o ovo
é
nada mais que
ovo
mais que nada
ovo
até no seu escrito


sábado, 27 de fevereiro de 2010

A PALAVRA REDIVIVA (Ema Viana)


Quando zumbem e silvam e ciciam
Na substância amorfa dos ruídos,
As palavras-som sulcam seus sentidos
Em sentidos outros que sentenciam.

Do curso melódico e circular
As palavras-som à cadeia assomam
Como forma de sonidos que a domam
Quando o fluxo-tempo se faz cortar.

Mas se a extensão da folha de papel
Torna-se o novo campo de batalha
E delas o sônico efeito falha,

Eis que sem verterem-se em ouropel
E dando provas de desembaraço
As palavras-som exploram o espaço.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

ANATOMIA DO MONÓLOGO (José Paulo Paes)

ser ou não ser ?
er ou não er ?
r ou não r ?
ou não ?
onã?


terça-feira, 8 de dezembro de 2009

PASSAGEIRO (Ema Viana)

Sai da casca
Larga o todo-dia-tudo-igual
Pára para não encontrar-te em confusão
De ser balança-de-dois-pratos
E viver a pesar a pesar apesar
O mundo não é um armazém
A despeito do muito que há em comum
E tu não vales o que o gato enterra
E queres dar-te importância
Colocando-te acima da ordinária existência
Não és sequer conhecedor de ti mesmo
E vens pretensioso dizer que me conheces
Deixa-te, isto sim, afogar nas sujas águas do cocó
Ou pula de um alto edifício do centro da cidade

Não encontras explicações, bem o sei
Mas também não há quem as encontre
Embriaga-te o curso das coisas
O fluir de tudo, sempiterno
Enquanto a tua alma se dilacera
E o teu corpo se deteriora
Continua
O correr das águas dos rios
O mar monotonamente vem despejar-se
Nas areias tantas de tantas praias
Dia e noite se sucedem
Continua o riso o choro
O amor o ódio o belo o feio
Deus e o diabo
Continuam


domingo, 1 de novembro de 2009

UTILITARISMO (Ema Viana)

No mercado sócio-emotivo,
Exponho meu coração.
Leiloá-lo, eis seu uso.
Ele: torto parafuso.


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domingo, 25 de outubro de 2009

BALADA DE UM ESQUISOFRÊNICO MEGALÔMANO (Ema Viana)


os astros me vendo passar
cochichavam
interjectivos

"é aquele
aquele lá
pretensão a dele
querer irradiar luz semelhante à nossa
coitado pobre coitado"

também as trevas me vendo passar
"obscuro
fogo-fátuo

sim 
mas
tão pretensioso
pensa o vazio e é tão cheio
não é dos nossos"

solucionar-me no intermédio
buscando sempre
equilibar-me entre

I M P O S S Í V E I S


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AMEAÇA (Ema Viana)

Não! Já não sei se mereço
Tanto tudo o que a ti peço
Mas aqui e agora confesso
Não me faças do vão sonho
Cessar o curso risonho
Que sou capaz e te esqueço

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