segunda-feira, 30 de agosto de 2021
quinta-feira, 26 de agosto de 2021
Com/contra Mário Quintana
quando um pedaço de laço
deixa outro pedaço de laço
no abraço
não como no laço
pedaço e pedaço permanecem
pedaço e pedaço saem mais que pedaços do laço
saem pedaços abraçados
pedaços do laço do abraço
pedaços abraçolaçados
deixa outro pedaço de laço
no abraço
não como no laço
pedaço e pedaço permanecem
pedaço e pedaço saem mais que pedaços do laço
saem pedaços abraçados
pedaços do laço do abraço
pedaços abraçolaçados
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domingo, 4 de abril de 2021
sábado, 27 de março de 2021
segunda-feira, 8 de março de 2021
Poema carnavalesco
carne é nau
nau deriva
em alto mar
carne é sal
sal saliva
pro paladar
carne é flor
florilégio
de navegar
carne é vau
vau mistério
de naufragar
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quarta-feira, 29 de julho de 2020
SENZA RISCOPRIRE ALCUNA SPERANZA
Em pústula entumescida
Guardam-se da agulha do tempo
Os poemas adiados
Rompe-se-lhe o fino epidérmico
E excretam-se-lhe os versos intempéries
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segunda-feira, 29 de junho de 2020
Há algum tempo, calava-me diante de argumentos a favor de aulas semi-presenciais, um meio que ensino à distância, ou quase. Diziam-me que, com o avanço da tecnologia, muito do que se fazia em sala presencialmente poderia ser substituído, com vantagem, por atividades on-line. Era o futuro. Vi-me na iminência de dar razão aos que denunciavam a obsolescência do estilo de aula tradicional. A pandemia chegou e nos isolou. No entanto, deu-me a entender que ter silenciado perante aqueles argumentos não foi boa opção pois nada é comparável a uma aula com corpo e alma presentes. Quando t(r)ocada com amor, aula é uma espécie de ritual sagrado, de dádiva adventícia na sua irrepetibilidade. Os vocacionados se preparam para ela desde dentro e para sempre. Curtem a espera, o encontro, o ler-se mutuamente a presença em muitos níveis. Gostam de partilhar o mesmo espaço físico, de vê-lo preenchido com a vida múltipla e variada em ação. Aula é um encontro sem igual que prepara conservando a nossa humanidade. Sou hoje defensor ferrenho desse encontro sagrado em que se celebram o saber sentir e o sentir saber.
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quinta-feira, 21 de maio de 2020
segunda-feira, 18 de novembro de 2019
SUMA TRADUÇÃO
mistério
intraduz
pouco demais
e o pouco do mais
que extraduz
que extraduz
em arte-fato
torna-nos além
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quarta-feira, 23 de outubro de 2019
Vi prodígios de inteligência e intuição numa existência tumultuada pela Verdade. No caminho aberto pelo gigante, a cada papo e afago de alma, o topo oco de minha cabeça ganhava qualquer ou nenhuma direção. Exímio em tudo! Para quem o conheceu de perto, é mestre eterno a ensinar a líquida consistência do ser. Guardo-o em mim. Um zilhão de vezes: obrigado, Paulo Mosânio.
Com você, a alta cultura, pascalianamente despida do vaidoso manto nobiliárquico, dava voos rasos nas nossas cabeças, longe, muito longe do pomposo aparato da erudição balofa e sem propósito. Era em roupa comum e cotidiana, franciscanamente simples, que a nobreza generosa do seu espírito doava, com zelo e amor, o saber cultivado nos vãos luminosos da sua mente-coração. Com você, era o saber peripatético, o credo quia absurdum, a régua nominalista, o deus sive natura, o budismo moderno, os versos íntimos da mão que afaga e apedreja, os ademanes de ternura, a flor do lodo, o sagrado, o profano, o estado de perene poesia. E o gesto ostensivo do braço todo arrepiado.
Era assim, é assim, será assim, da cátedra à mesa de bar, ob-ligado a você, Paulo Mosânio.
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sábado, 12 de janeiro de 2019
Flor de melancolia
tão festiva a rua passa
pelos olhos da menina melancólica
que flores de melancolia
desabotoam
nos olhos
pelos olhos da menina melancólica
que flores de melancolia
desabotoam
nos olhos
de rua
da menina
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segunda-feira, 29 de outubro de 2018
ANTILÓGICA DA MAIS-VALIA II
bordado de poesia
na barra dura do dia
a dia mais eu queria
bordado de poesia
bordado de poesia
ante toda vilania
momento epifania
bordado de poesia
bordado de poesia
num coração valentia
contra qualquer tirania
bordado de poesia
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na barra dura do dia
a dia mais eu queria
bordado de poesia
bordado de poesia
ante toda vilania
momento epifania
bordado de poesia
bordado de poesia
num coração valentia
contra qualquer tirania
bordado de poesia
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sábado, 9 de junho de 2018
SÚMULA DE UM HOMEM DE NEGÓCIO
Vendia pirulito-guarda-chuva naquela tabuinha com pequenos furos suspensa por um barbante volteando o pescoço. Uns dez anos por aí. Dos seus primeiros trabalhos. Depois picolé, maçã do amor e quebra-queixo. Um dia passou por casa de porta aberta, longo corredor e trânsito de gente prometendo boas vendas. Dentro, velava-se defunto.
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quarta-feira, 6 de junho de 2018
Qual seria a palavra mais esculhambada da língua portuguesa?
Para produzi-la, a língua e a boca fazem tantos torneios que chegam à iminência de esculhambarem-se. São múltiplos pontos e modos de articulação: vogais alta e baixa, anterior e posterior, oral e nasal, arredondada e não-arredondada, consoantes oclusiva, fricativa, lateral e, para sua maior esculhambação, a palavra ainda conta com um ditongo nasal dificilmente encontrável em outro idioma. "Esculhambação" legítima mesmo só existe em língua portuguesa.
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sexta-feira, 18 de maio de 2018
terça-feira, 15 de maio de 2018
quinta-feira, 10 de maio de 2018
PARA DOXA
Noite gelada. Família saindo de restaurante com meia garrafa de vinho nas mãos. À frente, cena trágico-lírica. Morador de rua abraçado a um cão numa esquina. Frio fino de cortar a medula. Lógica implicativa: vinho aquece.
- Meu senhor, aceitaria?
- Não, muito obrigado! Eu não bebo.
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- Meu senhor, aceitaria?
- Não, muito obrigado! Eu não bebo.
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domingo, 8 de abril de 2018
É
Vi prodígios de inteligência e intuição numa existência tumultuada pela Verdade. No caminho aberto pelo gigante, a cada papo e afago de alma, o topo oco de minha cabeça ganhava qualquer ou nenhuma direção. Exímio em tudo, para quem o conheceu de perto, é mestre eterno a ensinar a líquida consistência do ser. Guardo-o em mim. Um zilhão de vezes: obrigado, Paulo Mosânio!
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sexta-feira, 23 de março de 2018
sábado, 3 de fevereiro de 2018
quarta-feira, 31 de janeiro de 2018
terça-feira, 16 de janeiro de 2018
FAMÍLIA
Estranha essa coisa de família. Afeto que se estende generoso e sem medida cabendo nele o mesmo e outros sangues. É um querer ser perto nas distâncias do dia a dia. É certeza última, dúvida, alegria. Lugar onde se começa e se termina criança. Sítio onde pode a máscara descansar. Família é colchão macio para o corpo exausto de viver. Família é "celula mater", é matéria de bem-querer.
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sexta-feira, 15 de dezembro de 2017
RIMA POBRE
nada
no poema
da palavra habilitada
a rimar
seja o que flor
amor ou dor
lançar fora do poema
por favor
rimar em al
por exemplo
é mal banal
original
é fazer o al
do canivete
mais que o do punhal
soar igual
substantival
a outro al
que ecoa
na pessoa boa
magoa
e é fatal
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no poema
da palavra habilitada
a rimar
seja o que flor
amor ou dor
lançar fora do poema
por favor
rimar em al
por exemplo
é mal banal
original
é fazer o al
do canivete
mais que o do punhal
soar igual
substantival
a outro al
que ecoa
na pessoa boa
magoa
e é fatal
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quinta-feira, 7 de dezembro de 2017
SILÊNCIO
tantas são as confissões a fazer
tantos por dizer assediam
que muito aborrece a profusão
do inchado de palavras e sentidos
cultua o profanado
silencia
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tantos por dizer assediam
que muito aborrece a profusão
do inchado de palavras e sentidos
cultua o profanado
silencia
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quarta-feira, 6 de dezembro de 2017
SONHO DANTESCO
num trenó tracionado por renas voadoras
uma mula sem cabeça
veio enjaular
veio enjaular
o saci-pererê e o curupira
hércules-quasímodos
de um brasil multilado
-
hércules-quasímodos
de um brasil multilado
-
TEMPO
tempo para o trabalho
trabalho para o dinheiro
dinheiro para o trabalho
trabalho para o tempo
-
trabalho para o dinheiro
dinheiro para o trabalho
trabalho para o tempo
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sexta-feira, 1 de dezembro de 2017
SOBRE NOMES
Aggio, Rigo, Turpin, Cury, Tomiazo, Guirar, Schmidt, Boechat, Boa Ventura, Ibarra e um Souza, eis os sobrenomes de uma página brasileira do face em cujo diálogo entrei por acaso. No texto principal, motivador das postagens, tecia-se um discurso-leitura da situação política brasileira e, segundo os frequentadores do autor e, provavelmente, o próprio autor, o texto pretendia-se irônico. Não captei a ironia, evidente talvez para os frequentadores da página. Depois de ter sido alvo de uma ironia, escrevi "captei as ironias". Fui amado pela resposta. Estava no jogo. Mas incomodado com a situação, postei: "Um comentário sobre a ironia. É uma figura de pensamento que mais depende do modo como o texto foi elaborado e do momento de sua recepção do que das intenções do autor. Trata-se de um efeito de sentido alcançado toda vez que o conteúdo captado no enunciado entra em relação com outro conteúdo, que lhe é contrário ou contraditório, atribuído à enunciação (ato de dizer). Para que esse efeito de sentido seja captado, é preciso então que os dois conteúdos estejam explicitados no enunciado: um como enunciado propriamente dito e outro como enunciação enunciada. Por exemplo, há ironia no dizer "captei as ironias" quando o texto no qual se diz ter captado as ironias não logrou dar forma à ironia." Não sei se os da página captaram a ironia, mas podemos ver que os sobrenomes ainda dividem o Brasil. Às vezes, as coisas se misturam um pouquinho e pinta um Szasz entre os da senzala ou um Silva entre os da casa-grande.
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quarta-feira, 8 de novembro de 2017
quarta-feira, 30 de agosto de 2017
ALIVE IN A LINE
para Aline
em estado puro
celebração da substância
em estado bruto
do denso e do volátil
em ti
sabem à vida
todos os sentidos
orbitante da tua feliz gravidade
louva
a carne que te gerou
e está a te gerar
a cada novo dia
-
em estado puro
celebração da substância
o absoluto
supremo da criaçãoem estado bruto
em ti
sabem à vida
todos os sentidos
orbitante da tua feliz gravidade
louva
a carne que te gerou
e está a te gerar
a cada novo dia
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domingo, 14 de maio de 2017
DIA DE MARIAS (Ema Viana)
alegria
neste dia
pra quem fia
e desfia
pela cria
alegria
pra maria
pra mairinha
pra meirinha
pra rosinha
pra carlinha
alegria
neste dia
mães Maria
-
neste dia
pra quem fia
e desfia
pela cria
alegria
pra maria
pra mairinha
pra meirinha
pra rosinha
pra carlinha
alegria
neste dia
mães Maria
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quarta-feira, 3 de maio de 2017
NOSSO PAI QUE ESTÁ NO SEU (Ema Viana)
Há algum tempo o tempo concedeu-me a graça de perceber o descompasso abissal que o tempo erige entre o que o espírito quer e o que pode o corpo. Estava estampado nas feições do meu pai, que sempre fora uma força da natureza numa infância sem fim. Naquele tempo, o tempo parou para pensar e, do tempo pensado, extraiu-se a tempo o dom do sem tempo do poema para meu pai, que não lhe chegou às mãos a tempo. Creio, no entanto, que tempo há para doá-lo aqui para ouvidos de matéria humana.
Guarda tua espada, destemido guerreiro.
Deixaram de ser as abstratas figuras
E não há mais dulcineias por quem lutar.
Recolhe-te, consternado, ao teu castelo
Provisório, reconhecendo-te velho.
Tens a pujança dos vinte
E teu corpo vencido denuncia a verdade.
Não fossem os espelhos,
Poderias imaginar-te a meio caminho,
Entre pujança e pungência.
No tempo de agora, desde o tempo de então, o tempo não parou, adensou-se mais e mais na infância sem fim do meu pai e o fez mergulhar no tempo profundo da hora absoluta.
Sensação esquisita a de não ter mais tempo para dizer a quem ouça com ouvidos de matéria humana “meu pai”.
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Guarda tua espada, destemido guerreiro.
Deixaram de ser as abstratas figuras
E não há mais dulcineias por quem lutar.
Recolhe-te, consternado, ao teu castelo
Provisório, reconhecendo-te velho.
Tens a pujança dos vinte
E teu corpo vencido denuncia a verdade.
Não fossem os espelhos,
Poderias imaginar-te a meio caminho,
Entre pujança e pungência.
No tempo de agora, desde o tempo de então, o tempo não parou, adensou-se mais e mais na infância sem fim do meu pai e o fez mergulhar no tempo profundo da hora absoluta.
Sensação esquisita a de não ter mais tempo para dizer a quem ouça com ouvidos de matéria humana “meu pai”.
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quinta-feira, 9 de março de 2017
sábado, 26 de novembro de 2016
POESIA DO COTIDIANO
Seu Zé Cláudio, 93 anos,
sem muita instrução formal,
confrontado com um
"tudo bem, seu Zé Cláudio?",
põe a pergunta noutra chave
respondendo macio e afiado:
Tudo é bom!
-
sem muita instrução formal,
confrontado com um
"tudo bem, seu Zé Cláudio?",
põe a pergunta noutra chave
respondendo macio e afiado:
Tudo é bom!
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sábado, 6 de agosto de 2016
A GRANDE JOGADA (Ema Viana)
jogador joga jogo
jogo jogado joga
jogado jogador
jogador de jogado
jogo jogador joga
e jogo joga jogo
jogando jogador
-
jogo jogado joga
jogado jogador
jogador de jogado
jogo jogador joga
e jogo joga jogo
jogando jogador
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sábado, 30 de janeiro de 2016
A LUCINAÇÃO (Ema Viana)
A nação é testemunha
Vitálício da mumunha
Larápio-mor, sua alcunha
Já não engana o tal Cunha
Pra esquecer essa vergonha
O Brasil inteiro sonha
Com a lei que lhe proponha
Cigarrinhos de maconha
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quinta-feira, 7 de janeiro de 2016
ANTILÓGICA DA MAIS-VALIA I (Ema Viana)
se
no produssumo
o humano sumo
é numo e numo
então
a poesia
a cada dia
é mais valia
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sexta-feira, 13 de novembro de 2015
DINÂMICA DA CONCENTRAÇÃO (Ema Viana)
uns sempre
outros não deixam de
outros ainda
às vezes sim
às vezes não
para que
os que nunca
continuem a
e os que sempre
não deixem de
-
outros não deixam de
outros ainda
às vezes sim
às vezes não
para que
os que nunca
continuem a
e os que sempre
não deixem de
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sábado, 26 de setembro de 2015
LEITURA (Ema Viana)
Sugestão para alguns estudantes das Ciências Humanas
para
de ler sem parar
de ler sem parar
para
parar
para ler
para ler
sábado, 29 de agosto de 2015
terça-feira, 7 de abril de 2015
quinta-feira, 1 de maio de 2014
MUSICORDANÇA (Ema Viana)
é música o corpo que dança
musidança o corpo mudança
e o corpo que música e dança
em musicordança se trança
em musicordança se trança
sexta-feira, 24 de janeiro de 2014
ODISSEIA DO INSTANTE (Ema Viana)
Como reteso dardo que se brande
Ante horda de inimigo espicaçada,
Com a cabeça encimando haste grande,
Vibra pela ferida desejada.
Contra a fenda de lábios excitada,
Logo investe com a sua rubra glande
E, numa cega e primeira estocada,
Mais o seu volume flâmeo se expande.
Depois, em mão nervosa beligera
Procurando oponente imaginário,
Hirta-se, faz-se gládio, vira fera
E cumpre obediente o seu calvário
Até o espasmo-fim em que se adultera
No lacteo que lhe sela o obituário.
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quarta-feira, 15 de janeiro de 2014
CONVERSA FIADA (Ema Viana)
Aí o discípulo perguntou:
- Mestre, o que é o "eu"?
- O "eu" é antes de tudo um "ele" que "você" ilude e pensa muito conhecer.
-
- Mestre, o que é o "eu"?
- O "eu" é antes de tudo um "ele" que "você" ilude e pensa muito conhecer.
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sábado, 6 de julho de 2013
IRACEMA (Ema Viana)
Mira a cena
Iracema da América
Resolve voltar
É piracema
Ipanema
Cinema
E televisão
Iracema
Não quer mais não
Ela vai voltar
É piracema
Iracema
Irá, irá
De volta
De volta pra lá
Pra sina daquele lugar
É piracema
Iracema
Será, será
Silêncio lírico
No Ceará
'Stata à beira-mar
A mirar
A mirar
É piracema
É piracema-ma-ma
É piracema-ma-ma-ma-ma...
-
Iracema da América
Resolve voltar
É piracema
Ipanema
Cinema
E televisão
Iracema
Não quer mais não
Ela vai voltar
É piracema
Iracema
Irá, irá
De volta
De volta pra lá
Pra sina daquele lugar
É piracema
Iracema
Será, será
Silêncio lírico
No Ceará
'Stata à beira-mar
A mirar
A mirar
É piracema
É piracema-ma-ma
É piracema-ma-ma-ma-ma...
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quarta-feira, 22 de maio de 2013
domingo, 5 de maio de 2013
LIÇÃO DE LINGUÍSTICA (Ema Viana)
É certo que a língua
É coletiva e abstrata
Mas a língua viva
No concreto dela mesma
É a que passa pelo corpo
É a do cuspe privado do indivíduo.
-
É coletiva e abstrata
Mas a língua viva
No concreto dela mesma
É a que passa pelo corpo
É a do cuspe privado do indivíduo.
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domingo, 7 de abril de 2013
ADEUS AO EU (Ema Viana)
Para José Ney
Antes e sempre
Proferir-te como farsa
Eis a tua arte
Ser outro em cada canto
Diverso e mesmo para cada um
Fragmento e estilhaço
Depois e sempre
Ser do todo uma parte
Ou parte entre todos
Um todo talvez à parte
Ou quiçá
Parte sem do todo ser
Ou desejar
Eis a tua busca
Ver demais, a tua dor
Que potência no outrar-te
Sendo muitos
Sendo um
Sendo sendo
Nem um
Nenhum
Nada
Nada
Tudo
Todos
Uno
Uno
Uno
Uno
Dois de ti
Um no não
Um no sim
Noves fora
Tua saída
Mergulhar no todo-nada
Que é da vida
Um no Uno
Uno Uno
Enfim
-
Antes e sempre
Proferir-te como farsa
Eis a tua arte
Ser outro em cada canto
Diverso e mesmo para cada um
Fragmento e estilhaço
Depois e sempre
Ser do todo uma parte
Ou parte entre todos
Um todo talvez à parte
Ou quiçá
Parte sem do todo ser
Ou desejar
Eis a tua busca
Ver demais, a tua dor
Que potência no outrar-te
Sendo muitos
Sendo um
Sendo sendo
Nem um
Nenhum
Nada
Nada
Tudo
Todos
Uno
Uno
Uno
Uno
Dois de ti
Um no não
Um no sim
Noves fora
Tua saída
Mergulhar no todo-nada
Que é da vida
Um no Uno
Uno Uno
Enfim
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terça-feira, 26 de março de 2013
ARTES (Ema Viana)
Arte do espaço, a pintura
O tempo, dizer procura
Em vão
Do tempo a música é a arte
Que com o espaço comparte
Em vão
Signar tempo com espaço
Num vice-verso compasso
E não
Parecer algo impostura
Mal logra a literatura
Ou não
-
O tempo, dizer procura
Em vão
Do tempo a música é a arte
Que com o espaço comparte
Em vão
Signar tempo com espaço
Num vice-verso compasso
E não
Parecer algo impostura
Mal logra a literatura
Ou não
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domingo, 30 de dezembro de 2012
MULHER (Ema Bessar Viana)
Sem razão aparente, é a mercê
Da evidência do existir você
Que me leva, sei e não sei por quê,
Ao sabor de saber valer viver.
-
Da evidência do existir você
Que me leva, sei e não sei por quê,
Ao sabor de saber valer viver.
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sábado, 6 de outubro de 2012
A SEMIÓTICA ENTRE A SENSAÇÃO E A INTELECÇÃO
A semiótica, na versão tensiva de Zilberberg (a meu ver, complementar à semiótica clássica), retoma Merleau-Ponty, presente já no Semântica Estrutural de Greimas, e articula Cassirer, Deleuze e Valéry para desenvolver uma mínima iteligibilidade do sensível. Da Imperfeição e Semiótica das paixões, ambos livros do mestre lituano,
vão no mesmo "sentido". Todos tentam critérios mínimos para compreender
as condições de possibilidade do sentido, a partir do sensível, ou
investigam o sentido do sentido, como é comum se dizer entre os
semioticistas. Pensar o sentido nas suas nascentes é tentar traduzir o
sensível em inteligível: tarefa sempre inacabada ou por começar. Fora
desta ilusão de "cientificidade", entendida como projeto de
conhecimento, há o vivido,
isto é, as fricções, os atritos entre a carne-mente-espírito do homem e
a carne-mente-espírito do mundo. O intelecto descontinuíza e estabiliza
para organizar o inorganizável e a sensibildiade
desestabiliza e continuíza para desorganizar o organizado... Não tem fim... Estamos
condenados a fazer sentido, mesmo que seja pela negação dele, e toda a liberdade possível acontece condicionada pelo sentido já feito e abre-se para o ainda por fazer.
-
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terça-feira, 7 de agosto de 2012
NEGUIM ADOTA NEGÃO ou O MENINO É PAI DO HOMEM
Para Pedro Arthur e Garcia
Pode a carne até não terE seu sangue assimilado
Dou fé entanto parecer
Raras vezes alcançado
O filho com o pai porque
Herdeiro sem ter herdado
Não nega neguim negão
Nem negão nega neguim
Com idêntica energia
Assim tão aparentado
Genoma nenhum faria
Se no pai do filho dado
O filho já não dado ia
Concebido no esperado
Não nega neguim negão
Nem negão nega neguim
Negará neguim negão?
Neguim negão nega não
Pois neguim negão será
E negão, neguim gagá
quinta-feira, 17 de maio de 2012
MACHADO ROSA CUNHA (Ema Bessar Viana)
o criança literatura rosa
e machado o velho dela prosa
o ser tão tão de dentro rosa cunha
e euclides o de fora testemunha
-
e machado o velho dela prosa
o ser tão tão de dentro rosa cunha
e euclides o de fora testemunha
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sexta-feira, 30 de dezembro de 2011
METAMORFOSE (Ema Bessar Viana)
a ideia lhe acorreu
quis vesti-la com palavra
pôs-se inteiro na tarefa
fez não fez
fez não fez
palavra por palavra
da ideia outra coisa
da ideia outra coisa
que a palavra não transporta
t
r
a
n
s
aborda
aporta
aborta
a
i
d
e
i
a
e daí
de uma ideia nova
aí é dia
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quarta-feira, 8 de junho de 2011
OS BAMBAS (Ema Bessar Viana)
nem
osama
a bomba
nem
osama
a bomba
usa
nem
os ama
o bambo
o bambo
obama
os bambas
usamam
abusamam
ossamam
men
os bambas
usamam
abusamam
ossamam
men
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domingo, 22 de maio de 2011
ESCRITURA (Ema Bessar Viana)
Para Tércia Montenegro
crítico desabusoo texto dela
equilíbrio
de ditos
de por dizeres
texto justa-medida
é esta
a sua escrita
não apuro formal
nem excelir de conteúdo
mas o com mestria
poética extemporânea
tem sabor a sua pena
à qual devoto bênção
humilde e celebrante
ela é
a quem
muito mais além
no quando
ela erra
ninguém
mas
ela nutre
na vertigem
da escrita
que ela erra
no dentro do dentro dela
alguém
salve, salve!
salve a palavra dela
palavra que é
no onde
ela duela
com o do eu
do ela mesma!
salve, salve!
celebro
o texto ela
anverso
do ela texto
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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
O GATO (Ema Bessar Viana)
Indiferente
O gato
Melisma o silêncio
Reticencia o tempo
Agudiza o abismo
No mover-se
Seu olhar
Ri sinistro
Do estarmos
Entupidos de nada
E bastante comovidos
Indiferente
Seu dorso
Eriçado
Esfingia-se
Dócil e agressivo
Mas ainda
Indiferente
Seu rabo
Perscrutante
Conecta
Suprarrealidades
De borboleta e colibri
Indiferente
-
O gato
Melisma o silêncio
Reticencia o tempo
Agudiza o abismo
No mover-se
Indiferente
Seu olhar
Ri sinistro
Do estarmos
Entupidos de nada
E bastante comovidos
Indiferente
Seu dorso
Eriçado
Esfingia-se
Dócil e agressivo
Mas ainda
Indiferente
Seu rabo
Perscrutante
Conecta
Suprarrealidades
De borboleta e colibri
Indiferente
-
terça-feira, 9 de novembro de 2010
(IN)DEFINIÇÃO (Ema Bessar Viana)
Para Garcia
Constróis pontes de luz para as ilhas
Que há muito te descobriste ser.
Plurimorficamente te encruzilhas
Em vias de dever e de querer.
Em cada novo ponto da estrada,
Apresenta-se audaciosa ante ti
Outra sempre tenaz encruzilhada,
A que tua resposta é só: "resisti(r)".
Daí serem diversos os garcias.
No mínimo um que cotidiano age
Vivendo a vida a que o outro reage.
Adivinhar qual no correr dos dias
É aquele com o qual se interage...
Ah! Isto é grande e sacana sacanage.
Que há muito te descobriste ser.
Plurimorficamente te encruzilhas
Em vias de dever e de querer.
Em cada novo ponto da estrada,
Apresenta-se audaciosa ante ti
Outra sempre tenaz encruzilhada,
A que tua resposta é só: "resisti(r)".
Daí serem diversos os garcias.
No mínimo um que cotidiano age
Vivendo a vida a que o outro reage.
Adivinhar qual no correr dos dias
É aquele com o qual se interage...
Ah! Isto é grande e sacana sacanage.
terça-feira, 24 de agosto de 2010
CABO VERDE BRASIL (Ema Bessar Viana)
Sólidas pontes imateriais
Ergueram-se por sobre o oceano
Ligando dois povos que, de ano em ano,
Vão se tornando menos desiguais.
Uma mesma disposição os anima:
A de abolir relações verticais,
A de que entre homem e homem nunca mais
Viceje qualquer formação que oprima.
Do elevado propósito que os guia
Reúne-os igualmente a Fortaleza:
Ter em mira realizar algum dia,
Irmanado na língua portuguesa,
O quinto império de um povo-alegria
Que viva em plenitude a morabeza.
-
Ergueram-se por sobre o oceano
Ligando dois povos que, de ano em ano,
Vão se tornando menos desiguais.
Uma mesma disposição os anima:
A de abolir relações verticais,
A de que entre homem e homem nunca mais
Viceje qualquer formação que oprima.
Do elevado propósito que os guia
Reúne-os igualmente a Fortaleza:
Ter em mira realizar algum dia,
Irmanado na língua portuguesa,
O quinto império de um povo-alegria
Que viva em plenitude a morabeza.
-
terça-feira, 15 de junho de 2010
PRESENÇA (Ema Bessar Viana)
É do perfume que exalas
Quando de vista te perco
Que tua presença se faz.
No esboçar-te a imagem
Âncora-perfume te ergo
Para os meus olhos de cais.
É quando toda em olores
Em vivo e vivo em cores
Tua presença fugaz.
Quando de vista te perco
Que tua presença se faz.
No esboçar-te a imagem
Âncora-perfume te ergo
Para os meus olhos de cais.
É quando toda em olores
Em vivo e vivo em cores
Tua presença fugaz.
TARDE AZUL (Ema Bessar Viana)
vem, tarde azul,
desmesura
do outrora menino
vadio e sem ninho,
não te recuses a pousar
vem, tarde azul,
o adulto te quer
de novo
viver
e em ti
re
pousar
desmesura
do outrora menino
vadio e sem ninho,
não te recuses a pousar
vem, tarde azul,
o adulto te quer
de novo
viver
e em ti
re
pousar
ESTALIDO NA NOITE (Ema Bessar Viana)
A Mirko Élvis
Meu primo morreu. Imagino com que espanto
Ficou traspassado pela bala do revólver
De olho vidrado no evento.
Filho e mulher ficaram sem
Com o tiro do revólver.
Sabe lá em que transe,
Com que imagens animado
O revólver na aventura?
Adrenalina no metal.
Foi-se meu primo sem
Com o tiro do revólver.
-
NA TAL TERRA (Ema Viana)
Na
tal terra
da boa vontade,
é sempre encontro
de diferenças, sem medo,
sem ortodoxias, sem pretensões
de qualquer altura.
Na tal terra da esperança,
é permitido viver pela graça do simples viver,
com o viver do outro.
Na tal terra da comunhão,
homem não julga homem,
ama assim pelo só exercício de amar.
Na tal terra da harmonia,
tudo é música a concertar almas reféns da nostalgia da perfeição.
Na tal terra da bem-aventurança,
grassa plena a fraternidade universal.
Na tal terra da consagração,
o agora instante de suave e doce congraçamento
q
u
e
r
-
s
e
eternizado.
-
tal terra
da boa vontade,
é sempre encontro
de diferenças, sem medo,
sem ortodoxias, sem pretensões
de qualquer altura.
Na tal terra da esperança,
é permitido viver pela graça do simples viver,
com o viver do outro.
Na tal terra da comunhão,
homem não julga homem,
ama assim pelo só exercício de amar.
Na tal terra da harmonia,
tudo é música a concertar almas reféns da nostalgia da perfeição.
Na tal terra da bem-aventurança,
grassa plena a fraternidade universal.
Na tal terra da consagração,
o agora instante de suave e doce congraçamento
q
u
e
r
-
s
e
eternizado.
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sábado, 10 de abril de 2010
ADOÇÃO (Ema Viana)
Para Mônica, Daniel e William
Testemunho dou de feliz encontro
Entre dois meninos e uma mulher
Que a cumprirem o que o destino quer
Convergiram rotas a um mesmo ponto.
Os três viviam o momento certo
De unirem-se em rara laqueadura.
Negaram então o espaço que enclausura
E fundiram-se por ser pouco o perto.
De unirem-se em rara laqueadura.
Negaram então o espaço que enclausura
E fundiram-se por ser pouco o perto.
Não queriam um do outro só estar ao lado
Pois que cada um andava descontente
E um do outro sabiam-se dependente.
Pois que cada um andava descontente
E um do outro sabiam-se dependente.
Um querer estar juntamalgamado
Fez ver que seria enfim acertado
Darem-se uns aos outros por presente.
-
Fez ver que seria enfim acertado
Darem-se uns aos outros por presente.
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domingo, 28 de março de 2010
OFÍCIO (Ema Viana)
Para Crisca
parece quando falas
que vens de terras longínquas
tens uma certa linguagem
entrecruzar de línguas
falas do que falas
como quem cala
segredos
de faca
de ponta
responsável bisturi
de corte preciso
conciso
tua palavra somato-resvala
arde na epiderme
rasga carne
quebra ossos
tua palavra não cala
traspassa
de tantas línguas que dizes
por estrangeira a tua fala
tua palavra
trapaça
aprendiz das línguas que falas
mais que aprendiz
me deixo fazer nas palavras
que lavras
como falas
o que falas
agora
o falo
MERATRIZ
que vens de terras longínquas
tens uma certa linguagem
entrecruzar de línguas
falas do que falas
como quem cala
segredos
de faca
de ponta
responsável bisturi
de corte preciso
conciso
tua palavra somato-resvala
arde na epiderme
rasga carne
quebra ossos
tua palavra não cala
traspassa
de tantas línguas que dizes
por estrangeira a tua fala
tua palavra
trapaça
aprendiz das línguas que falas
mais que aprendiz
me deixo fazer nas palavras
que lavras
como falas
o que falas
agora
o falo
MERATRIZ
PERFEIÇÃO (Ema Viana)
no dentro e no fora de si mesmo
o ovo impressiona
no que tem de acabado
o ovo não tem pontas
no ser ovo ovalado
carne e osso
calcificados
o ovo
é
nada mais que
ovo
mais que nada
ovo
até no seu escrito
o ovo impressiona
no que tem de acabado
o ovo não tem pontas
no ser ovo ovalado
carne e osso
calcificados
o ovo
é
nada mais que
ovo
mais que nada
ovo
até no seu escrito
sábado, 27 de fevereiro de 2010
A PALAVRA REDIVIVA (Ema Viana)
Quando zumbem e silvam e ciciam
Na substância amorfa dos ruídos,
As palavras-som sulcam seus sentidos
Em sentidos outros que sentenciam.
Do curso melódico e circular
As palavras-som à cadeia assomam
Como forma de sonidos que a domam
Quando o fluxo-tempo se faz cortar.
Mas se a extensão da folha de papel
Torna-se o novo campo de batalha
E delas o sônico efeito falha,
Eis que sem verterem-se em ouropel
E dando provas de desembaraço
As palavras-som exploram o espaço.
sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
PASSAGEIRO (Ema Viana)
Sai da casca
Larga o todo-dia-tudo-igual
Pára para não encontrar-te em confusão
De ser balança-de-dois-pratos
E viver a pesar a pesar apesar
O mundo não é um armazém
A despeito do muito que há em comum
E tu não vales o que o gato enterra
E queres dar-te importância
Colocando-te acima da ordinária existência
Não és sequer conhecedor de ti mesmo
E vens pretensioso dizer que me conheces
Deixa-te, isto sim, afogar nas sujas águas do cocó
Ou pula de um alto edifício do centro da cidade
Não encontras explicações, bem o sei
Mas também não há quem as encontre
Embriaga-te o curso das coisas
O fluir de tudo, sempiterno
Enquanto a tua alma se dilacera
E o teu corpo se deteriora
Continua
O correr das águas dos rios
O mar monotonamente vem despejar-se
Nas areias tantas de tantas praias
Dia e noite se sucedem
Continua o riso o choro
O amor o ódio o belo o feio
Deus e o diabo
Continuam
Larga o todo-dia-tudo-igual
Pára para não encontrar-te em confusão
De ser balança-de-dois-pratos
E viver a pesar a pesar apesar
O mundo não é um armazém
A despeito do muito que há em comum
E tu não vales o que o gato enterra
E queres dar-te importância
Colocando-te acima da ordinária existência
Não és sequer conhecedor de ti mesmo
E vens pretensioso dizer que me conheces
Deixa-te, isto sim, afogar nas sujas águas do cocó
Ou pula de um alto edifício do centro da cidade
Não encontras explicações, bem o sei
Mas também não há quem as encontre
Embriaga-te o curso das coisas
O fluir de tudo, sempiterno
Enquanto a tua alma se dilacera
E o teu corpo se deteriora
Continua
O correr das águas dos rios
O mar monotonamente vem despejar-se
Nas areias tantas de tantas praias
Dia e noite se sucedem
Continua o riso o choro
O amor o ódio o belo o feio
Deus e o diabo
Continuam
domingo, 1 de novembro de 2009
UTILITARISMO (Ema Viana)
No mercado sócio-emotivo,
Exponho meu coração.
Leiloá-lo, eis seu uso.
Ele: torto parafuso.
-
Exponho meu coração.
Leiloá-lo, eis seu uso.
Ele: torto parafuso.
-
domingo, 25 de outubro de 2009
BALADA DE UM ESQUISOFRÊNICO MEGALÔMANO (Ema Viana)
os astros me vendo passar
cochichavam
interjectivos
"é aquele
aquele lá
pretensão a dele
querer irradiar luz semelhante à nossa
coitado pobre coitado"
também as trevas me vendo passar
"obscuro
fogo-fátuo
sim
mas
tão pretensioso
pensa o vazio e é tão cheio
não é dos nossos"
solucionar-me no intermédio
buscando sempre
tão pretensioso
pensa o vazio e é tão cheio
não é dos nossos"
solucionar-me no intermédio
buscando sempre
equilibar-me entre
I M P O S S Í V E I S
I M P O S S Í V E I S
-
AMEAÇA (Ema Viana)
Não! Já não sei se mereço
Tanto tudo o que a ti peço
Mas aqui e agora confesso
Não me faças do vão sonho
Cessar o curso risonho
Que sou capaz e te esqueço
-
Tanto tudo o que a ti peço
Mas aqui e agora confesso
Não me faças do vão sonho
Cessar o curso risonho
Que sou capaz e te esqueço
-
FILHO (Ema Viana)
as palavras falam do inessencial.
não há porquê nem onde, quando ou como.
é no atemporal espaço horizontal dos abraços,
no sem-razão,
onde todo o nosso ser
carne estrangeira,
e habito o não-ser
que vai de mim para você.
-
não há porquê nem onde, quando ou como.
é no atemporal espaço horizontal dos abraços,
no sem-razão,
onde todo o nosso ser
objetualizável,
que sou você, meu filho,carne estrangeira,
e habito o não-ser
que vai de mim para você.
-
BEIJO (Ema Viana)
que doce beijo
em ti eu vejo
vejo tantas coisas em ti
o maior ensejo
de todo o meu desejo
vir-se a cumprir
até vejo em ti
-
sábado, 24 de outubro de 2009
CONSCIÊNCIA (Ema Viana)
Saber queria de que modo se adensa
no dentro informe de toda gente
coisa assim concreta e tão presente
que é o pensamento que a si se pensa;
o pensamento que de si é o reflexo,
que reintegra do vivido a cadena,
e que incontinenti nos condena
ao fora de nós mesmos já sem nexo;
o pensamento que ordena a persona,
que estanca a existência fugidia
e faz a identidade vir à tona,
mas que ato contínuo nos exilia
em terreno ermo e nos abandona
ser sem Ser, tão-só devir... Eu queria.
sábado, 3 de outubro de 2009
PROCURA (Ema Viana)
Súbito toma-me desejo insano
De te ver. E a tua, minh'alma reclama.
Quer te ter aqui quem a ti tanto ama,
Quem contigo sonha há já um ano.
Se tanto amar, amor, não for humano,
A mim, destruir-me há de ardente chama.
Rogo-te: escuta e atende a voz que clama,
Retém-me c'os olhos o olhar cigano.
Meu sonho, deixa-o fluir lentamente,
Permita-me que siga a procurar-te,
Hoje e sempre, sim, incansavelmente,
Em todos os lugares, por toda parte.
E um dia quem sabe esta busca insistente
Finde e queira Deus que por encontrar-te.
-
De te ver. E a tua, minh'alma reclama.
Quer te ter aqui quem a ti tanto ama,
Quem contigo sonha há já um ano.
Se tanto amar, amor, não for humano,
A mim, destruir-me há de ardente chama.
Rogo-te: escuta e atende a voz que clama,
Retém-me c'os olhos o olhar cigano.
Meu sonho, deixa-o fluir lentamente,
Permita-me que siga a procurar-te,
Hoje e sempre, sim, incansavelmente,
Em todos os lugares, por toda parte.
E um dia quem sabe esta busca insistente
Finde e queira Deus que por encontrar-te.
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FILHA (Ema Viana)
Coriscaste no negrume de um céu,
Promessa de luz a romper o véu
Das noites fundas que a vida era
Naquela tarda baça primavera.
Crescendo teu brilho foi e por encanto
Tomou os espaços todos. Entretanto,
Havia negro um ponto resistente
A quem contra a barra dele tente.
Então sem muito empenho o presente
Daquele que era já um quase-incréu,
Foste entretecendo suavemente
E num hoje similar a um antecéu
Coabitamos sem o renitente
Negrume por força do teu cinzel.
-
Promessa de luz a romper o véu
Das noites fundas que a vida era
Naquela tarda baça primavera.
Crescendo teu brilho foi e por encanto
Tomou os espaços todos. Entretanto,
Havia negro um ponto resistente
A quem contra a barra dele tente.
Então sem muito empenho o presente
Daquele que era já um quase-incréu,
Foste entretecendo suavemente
E num hoje similar a um antecéu
Coabitamos sem o renitente
Negrume por força do teu cinzel.
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CÁRCERE (Ema Viana)
Crer no etéreo, em fadas, ninfas e gnomos,
Na dura mão do inexorável fado,
Que o caminho já nos deu... Certo ou errado?
Toda dúvida de que feito fomos.
Nos deuses todos do Olimpo onde pomos
O nosso sobe-e-desce projetado.
E mais: crer um dia ver saciado
O desejo de infinito que hoje somos.
Crer na nobre medieval missão
E nos cavaleiros do Grande Rei
Que viviam o Graal a procurar.
Ver-me preferia nesta ilusão
Enfim consciente de que escapei
Do exíguo cárcere de pensar.
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Na dura mão do inexorável fado,
Que o caminho já nos deu... Certo ou errado?
Toda dúvida de que feito fomos.
Nos deuses todos do Olimpo onde pomos
O nosso sobe-e-desce projetado.
E mais: crer um dia ver saciado
O desejo de infinito que hoje somos.
Crer na nobre medieval missão
E nos cavaleiros do Grande Rei
Que viviam o Graal a procurar.
Ver-me preferia nesta ilusão
Enfim consciente de que escapei
Do exíguo cárcere de pensar.
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Caetano Veloso (Phono 73)
Um bom exemplo do que é texto sincrético, para cuja elaboração concorre um cojunto de linguagens que se imbricam de modo a criar um efeito de sentido geral, que dá unidade ao todo.
-
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
LÓGICA INFANTIL (Ema Viana)
- hoje é amanhã!
- hoje é amanhã!
- hoje é amanhã!
- hoje é amanhã!
- hoje é amanhã!
Bia cobra a promessa de ontem.
- amanhã foi ontem!
- amanhã foi ontem!
- amanhã foi ontem!
Alice, a de anteontem.
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
ESTAÇÕES (Ema Viana)
deram em nada as primaveras que alegrei
as alegrias primaverarei
para depois outonarem-se
virão inverno e verão
e outras alegrias primaveradas
hão de outornar-se
são as estações do meu ser temporal
sucedem-se sem descanso
nos anos vivicíclicos
as alegrias primaverarei
para depois outonarem-se
virão inverno e verão
e outras alegrias primaveradas
hão de outornar-se
são as estações do meu ser temporal
sucedem-se sem descanso
nos anos vivicíclicos
POEMA DES-CARTESIANO (Ema Viana)
a verdade é uma só
e quem a disse não mentiu
é o homem em si um nó
de dúvidas que a dúvidas se uniu
triturado em pedra mó
-
domingo, 30 de agosto de 2009
TROCA (Ema Viana)
os homens que a cercam
trazem a flor do sexo
em franca exposição
prometem-lhe
algum regalo
amor etéreo
devoção
em troca
só lhe dão
solidão
trazem a flor do sexo
em franca exposição
prometem-lhe
algum regalo
amor etéreo
devoção
em troca
só lhe dão
solidão
segunda-feira, 20 de julho de 2009
-
A arte, de um modo geral, é equilíbrio de excessos e insuficiências. O artista do "mais" opera recessivamente com o "menos", ao passo que o do "menos" presta contas ao "mais". E ambos buscam o efeito sensível da modulação destes contrários. O grande artista cria equilíbrios instáveis que tensionam excessos e insuficiências de toda ordem e produzem "buracos no não" gerando os possíveis impossíveis e os impossíveis possíveis. O grande artista fura o cerco e nos conduz sem dizer para onde nem responder por quê. O grande artista se funda a si mesmo por seu fazer, e este nos co(n)funda na fruição que em nós nos inaugura.
-
A arte, de um modo geral, é equilíbrio de excessos e insuficiências. O artista do "mais" opera recessivamente com o "menos", ao passo que o do "menos" presta contas ao "mais". E ambos buscam o efeito sensível da modulação destes contrários. O grande artista cria equilíbrios instáveis que tensionam excessos e insuficiências de toda ordem e produzem "buracos no não" gerando os possíveis impossíveis e os impossíveis possíveis. O grande artista fura o cerco e nos conduz sem dizer para onde nem responder por quê. O grande artista se funda a si mesmo por seu fazer, e este nos co(n)funda na fruição que em nós nos inaugura.
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sábado, 18 de julho de 2009
PAVLOVIANA (José Paulo Paes)
a
a
a
a
a
a
a
a
a
o
o
a
o
a
a
a
a
a
a
a
o
a
o
o
o
o
o
a
a
a
a
a
a
a
a
a
Um impossível possível: em quatro segmentos, cada qual composto por três "estrofes" de três versos, com sintagmas nominais simples (artigo + nome substantivo), o autor fala dos automatismos (reflexos condicionados) nas dimensões física, espiritual, política e estética.
Guimarães Rosa (o pensador e o artista)
O poder de criar realidades pela linguagem e/ou o pressuposto de existência na lógica exemplarmente evidencidados num trecho do prefácio de Tutaméia.
Siga-se, para ver, o conhecidíssimo figurante, que anda pela rua, empurrando sua corrocinha de pão, quando alguém lhe grita: - "Manuel, corre a Niterói, tua mulher está feito louca, tua casa está pegando fogo!..." Larga o herói a carrocinha, corre, voa, vai, toma a barca, atravessa a Baía quase... e exclama: "- Que diabo! eu não me chamo Manuel, não moro em Niterói, não sou casado e não tenho casa...".
Siga-se, para ver, o conhecidíssimo figurante, que anda pela rua, empurrando sua corrocinha de pão, quando alguém lhe grita: - "Manuel, corre a Niterói, tua mulher está feito louca, tua casa está pegando fogo!..." Larga o herói a carrocinha, corre, voa, vai, toma a barca, atravessa a Baía quase... e exclama: "- Que diabo! eu não me chamo Manuel, não moro em Niterói, não sou casado e não tenho casa...".
segunda-feira, 13 de julho de 2009
TAMBOR (Ema Viana)
a média não anuncia
mas os tambores renunciam
aos excessos da alegria
o tambor já foi triste
pulsação
falar percussivo do coração
já foi banzo
cantou tristezas e alegrias
falou com deuses
festejou chorou esqueceu
o tambor quer
as antigas suas linguagens
quer sair
do popular tambor pra pular para parolar
noutras linguagens
do percussivo coração
mas os tambores renunciam
aos excessos da alegria
o tambor já foi triste
pulsação
falar percussivo do coração
já foi banzo
cantou tristezas e alegrias
falou com deuses
festejou chorou esqueceu
o tambor quer
as antigas suas linguagens
quer sair
do popular tambor pra pular para parolar
noutras linguagens
do percussivo coração
CALEIDOSCÓPIO (Ema Viana)
fragmentei-me em gostares
meu coração dividido
caleidoscopizou-se ainda mais
meus pais têm um naco
outro anda em meu peito
pedaços nas mãos de amigos
amores outros detêm
grande parte porém
putrefaz-se morta nas ruas
meu coração dividido
caleidoscopizou-se ainda mais
meus pais têm um naco
outro anda em meu peito
pedaços nas mãos de amigos
amores outros detêm
grande parte porém
putrefaz-se morta nas ruas
LUA E CHÃO (Ema Viana)
Para os coiotes
olhos postos na luapasseava sonhos fabulosos
viagens intergalácticas
suaves voos de pássaros
braços de bem-amada
a inteiro envolver-me
num acalanto sem par
súbito
os olhos me vão
da lua ao chão
o pé direito
tenho-o imerso
em ignorada substância
de amarelo aspecto
pisei no cocô
pisei no cocô
e não sei que fazer
água por perto não vejo
não vejo pano ou sabão
com que me possa limpar
pisei no cocô
enquanto sonhava
pisei no cocô
e estava descalço
pisei no cocô
e não sei que fazer
amiga me diga
amputo este pé
ou pisando na merda
aprendo a viver?
FARTA POESIA (Ema Viana)
farta poesia
no poemabrincadeiras de pensar
sinestesias
metaforizar
maresia
dói e corrói
o ferro
de todo dia
perartice do poema
farta poesia
domingo, 17 de maio de 2009
IMIGRAÇÃO (Ema Viana)
Vez no longe sudeste
O homem antes nordeste
Em desaprumo em desatino
Vai viver sudestino.
O homem antes nordeste
Em desaprumo em desatino
Vai viver sudestino.
CIRURGÊNCIA (Ema Viana)
À sombra de fartos e generosos galhos
De uma frondosa mangueira
Ele cuidava diligente
Da menina paciente
Enquanto
Fármacos penetrantes
Recendiam
Recendiam
No preparo da hirta cânula
E da mucosa vaporosa
Para a infusão
Do êxtase do tato
Noato do regalo
No
Do conhecerem-se
De repente
De repente
Despertaram
Eram deles os pais
E sem bem saber por quê
Uma sova de não esquecer jamais
-
-
BURACO NEGRO (Ema Viana)
foi tudo tão sem fundo
que o oco do mundo
nos tragou
foi todo tão luminoso
o caos gozoso
que brilhamos
foi tão oco o todo breu
que o brilho esmaeceu
e nos insulamos
foi enfim tudo tão sem fim
que agora em mim
é sempre amanheceu
-
que o oco do mundo
nos tragou
foi todo tão luminoso
o caos gozoso
que brilhamos
foi tão oco o todo breu
que o brilho esmaeceu
e nos insulamos
foi enfim tudo tão sem fim
que agora em mim
é sempre amanheceu
-
SONETO FALHO ou SÓ NOTO DOIS QUARTETOS (Ema Viana)
não atino a que deva atribuir
o excêntrico gosto por sonetar
mas sei que esta forma particular
trasmuta sublimando o que vivi
dá-lhe o acabamento necessário
extrai do vivido a forma pura
assim como o escultor a escultura
faz nascer do material precário.
-
o excêntrico gosto por sonetar
mas sei que esta forma particular
trasmuta sublimando o que vivi
dá-lhe o acabamento necessário
extrai do vivido a forma pura
assim como o escultor a escultura
faz nascer do material precário.
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sexta-feira, 3 de abril de 2009
ALFA & ÔMEGA (Dimas Carvalho)
A diferença toda está aqui:
O homem vivo é caveira que chora,
O homem morto é caveira que ri.
O homem vivo é caveira que chora,
O homem morto é caveira que ri.
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